Vem
sendo alvo de críticas de juristas a mais nova modalidade de usucapião –
direito de adquirir propriedade de um bem, geralmente imóvel, após sua
posse durante determinado tempo. Trata-se do chamado usucapião familiar,
aprovado pelo Congresso há pouco mais de um ano, que garante a
propriedade de imóvel urbano de até 250 metros quadrados do casal
unicamente ao cônjuge que permanecer na residência após dois anos da
saída do outro (Lei 12.424/2011). É o prazo mais curto entre todos os tipos de usucapião.
A
intenção dessa nova lei é proteger a pessoa que fica incumbida de dar
conta da casa, geralmente acompanhada dos filhos. No entanto, segundo os
críticos, predominam as inconveniências e as lacunas dos conceitos. Por
exemplo: fugir do lar devido a violência doméstica pode configurar
abandono? Essa nova lei não estimularia o divórcio (pois, numa crise
conjugal, quem se afastar do lar entrará logo na Justiça para evitar a
perda da propriedade, antes mesmo de tentar reconciliação)? Casais não
se considerarão obrigados a conviver juntos num período em que o
aconselhável, para o bem de possíveis crianças e do diálogo, seria o
afastamento enquanto se decide o futuro da propriedade?
Alternativas
O
professor de Direito Privado da Universidade de Brasília (UnB)
Frederico Viegas é um dos que acredita que o usucapião familiar traz
mais malefícios que benefícios.
—
É uma lei casuística. Estamos prestes a ver pessoas convivendo em
ambiente ruim, em prejuízo dos filhos, por causa do patrimônio. Há
outros mecanismos para garantir o direito de lar à família sem ser
usucapião: direito real de uso durante 20 ou 30 anos, por exemplo —
afirma o professor.
A
Lei 12.424/2011 surgiu da Medida Provisória (MP) 514/2010, que em sua
origem tratava principalmente do Programa Minha Casa, Minha Vida.
Durante a tramitação na Câmara dos Deputados, foi incluída a questão do
usucapião familiar, acrescentando o artigo 1.240-A ao Código Civil.
O
novo tipo de usucapião vem sendo acusado também de ser um retrocesso
jurídico, porque recupera a figura do culpado pela separação conjugal ao
punir quem deixa a residência. Isso, segundo os críticos, fere a
Constituição, que proíbe retrocessos jurídicos. Outro problema seria uma
falha de redação: se é “ex-cônjuge ou ex-companheiro”, como diz a lei,
então o fim da união estável já foi decretado, não havendo, portanto,
abandono de lar.
Subjetividade
Waldemir
Moka (PMDB-MS), que relatou a MP no Senado, explica que não houve tempo
de debater a questão do usucapião familiar em audiências públicas, por
exemplo. Ele lembra, no entanto, que se demonstrou preocupação com a
subjetividade do requisito abandono de lar.
—
Como sempre acontece nas votações de medidas provisórias, nosso prazo
era muito curto. Depois de tramitar na Câmara, o texto chegou ao Senado
cerca de 20 dias antes de perder a validade. E o foco principal era o
Programa Minha Casa, Minha Vida. Já que não houve oposição à proposta, o
texto foi aprovado — disse o senador.
Na
Câmara, a MP foi relatada pelo deputado André Vargas (PT-PR). Ao
contrário dos advogados que acusam a novidade de “retrocesso jurídico”,
ele considera o usucapião familiar uma revolução. Na época da aprovação
da MP, argumentou que o Programa Minha Casa, Minha Vida tem como
prioridade proteger as mulheres. “Vamos possibilitar a assinatura de
convênio pelas mulheres, é o chamado usucapião pró-familiar, que pode
ser usado quando o cônjuge não estiver mais no lar, possibilitando a
resolução da posse”, disse o deputado.
Fonte: Agência Senado
Publicado em 19/09/2012