Você
já percebeu a quantidade de leis, normas, decretos, projetos de lei,
resoluções, que são lançadas diariamente e que podem e transformam
nossas vidas! Algumas positivas, outras nos transtornam, muitas “não
pegam”. Entretanto outras tantas não são lembradas e poderiam fazer a
grande diferença!
É
por esse motivo que fiz questão de escrever este artigo para recorda-lo
da popularmente chamada “Lei do Cartório”. Lembra-se! É a lei que
permite a realização de separações, divórcios, inventários e partilha de
bens em cartório e foi saudada como uma oportuna medida para agilizar
esses processos, reduzindo a burocracia, os custos e, conseqüentemente, o
tempo de duração. No entanto, tenho notado que ainda pairam muitas
dúvidas por parte do público sobre como se beneficiar dessa medida.
Refiro-me a Lei 11.441 de Janeiro de 2007 e sua regulamentação, cujas
dúvidas foram solucionadas pela Resolução 35 do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), de 24 de abril de 2007.
O
primeiro ponto a esclarecer é quem pode se beneficiar com a nova lei.
Divórcios e separações só podem ser feitos em cartório se forem
consensuais, ou seja, se ambos os cônjuges estiverem de acordo em
relação a todos os aspectos do procedimento – como divisão de bens do
casal e o pagamento de pensões alimentícias, por exemplo. Todas essas
informações constarão em escritura pública a ser lavrada pelo tabelião.
Se houver litígio, a separação ou o divórcio só poderão ser realizados
pela via judicial, pois, evidentemente, cabe ao juiz arbitrar as
disputas, e não ao tabelião. Outra condição é que o casal não possua
filhos menores ou incapazes (caso dos deficientes mentais). Se possuir, é
obrigatório recorrer ao judiciário, que tem o dever de zelar para que
os interesses dos menores e dos incapazes sejam respeitados. Cumpridas
essas exigências, tanto a separação quanto o divórcio direto – bem como a
conversão da separação em divórcio – podem ser feitos
extrajudicialmente.
Outro
detalhe esclarecido pela Resolução diz respeito à mudança de sobrenome.
Se o cônjuge quiser mudar seu sobrenome de casado para o de solteiro
após a separação ou divórcio, poderá fazê-lo na própria escritura
pública. A alteração pode ser feita no ato ou posteriormente – mediante
declaração unilateral do interessado (isto é, o ex-cônjuge não precisa
estar presente nem se manifestar a respeito) e com assistência de
advogado. E tem mais. Se os cônjuges voltarem atrás e decidirem retomar
seu casamento, o restabelecimento da sociedade conjugal também pode ser
feito por escritura pública, ainda que a separação tenha sido judicial.
Contudo, os que optarem pela separação ou divórcio extrajudicial devem
estar cientes de que não há sigilo nas escrituras públicas desses
procedimentos. Se o casal fizer questão de manter em segredo os termos
de sua separação, então deverá recorrer à via judicial.
As
condições para a realização de inventários e partilhas de herança em
cartório são semelhantes. É necessário que haja comum acordo entre os
herdeiros e todos devem ser maiores de idade e capazes. Além disso, é
preciso que o falecido – ou o autor da herança – não tenha deixado
testamento. Se deixou, o inventário e a partilha terão de ser feitos
judicialmente.
Uma
dúvida que até pouco tempo atrás causou divergências entre os juristas
diz respeito à necessidade ou não de que esses procedimentos sejam
posteriormente homologados, ou ratificados, pelo juiz. A Resolução 35 do
CNJ de 24 de abril de 2007 esclareceu a questão ao estabelecer que as
escrituras públicas de inventário e partilha, separação e divórcios
consensuais não dependem de homologação judicial, sendo títulos válidos
para o registro civil e imobiliário e para a transferência de bens e
direitos (Detran, Junta Comercial, bancos, telefônicas etc.).
A
Resolução também traz uma boa notícia para os que vivem em união
estável. A pessoa que tiver direito à herança do companheiro (ou
companheira) falecido pode, desde que não seja o único herdeiro ou
herdeira, realizar os procedimentos de inventário e partilha em
cartório. Para que isso ocorra, porém, é necessário que todos os demais
herdeiros (que devem ser maiores e capazes) estejam de acordo –
inclusive no que diz respeito ao reconhecimento da união estável.
Cabe
lembrar, ainda, que mesmo aqueles que se enquadram nas exigências
necessárias para recorrer à via extrajudicial continuam tendo o direito
de optar pelo judiciário, se assim desejarem. E os que optaram por
realizar esses procedimentos em cartório continuam tendo o direito de
apelar aos tribunais caso surja alguma divergência posterior – como, por
exemplo, a revisão do valor da pensão alimentícia. Porém, se a revisão
da pensão for decidida amigavelmente, é possível retificar o valor na
própria escritura, sem a necessidade de ir aos tribunais.
Todos
esses procedimentos podem ser feitos em qualquer cartório de notas
escolhido pelos interessados, em qualquer cidade ou estado. Os valores
cobrados pelos tabeliães podem variar de um lugar para outro, mas é
importante ressaltar que a Resolução proíbe cobranças sob a forma de
porcentagens sobre os valores relativos à divisão de bens do casal ou da
herança. E se, mesmo assim, os interessados não puderem pagar, serão
isentos dos custos mediante a apresentação de uma declaração de que não
possuem condições de arcar com as despesas – ainda que estejam sendo
assistidos por um advogado contratado. A presença do advogado, aliás, é
obrigatória, pois esses procedimentos extrajudiciais não dispensam a
participação desse profissional. O tabelião não pode indicar um advogado
aos interessados. Pode, no entanto, recomendar aos que não dispõem de
recursos para contratar um advogado que recorram à Defensoria Pública
ou, onde não houver, à Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil.
Em
relação às atribuições dos tabeliães face à nova lei, é interessante
observar que eles podem se negar a lavrar a escritura de separação ou
divórcio caso percebam que os termos do acordo estão lesando os direitos
de um dos cônjuges, ou que um deles está sendo coagido a aceitar
condições que lhe são prejudiciais – uma medida que contribui para
tornar o procedimento mais seguro.
Ivone
Zeger é advogada especialista em Direito de Família e Sucessão. Membro
efetivo da Comissão de Direito de Família da OAB/SP é autora dos livros
“Herança: Perguntas e Respostas” e “Família: Perguntas e Respostas” – da
Mescla Editorial www.ivonezeger.com.br
Fonte: Conjur
Publicado em 29/04/2013